A CRISE MASCULINA A CRISE ÉTICA

 

A ensaísta e crítica literária norte americana, Camille Paglia em entrevista já mencionada neste blog, aponta sua preocupação com tantos homens jovens se envolvendo no Jihadismo, como também em torcidas sanguinárias de futebol, ou grupos de lutadores “esportivos” que saem às ruas para bater e até matar “adversários”. Ao contrário da hipótese sustentada por Camille, penso ser a motivação inconsciente para tal comportamento, a repressão da energia do feminino. Os valores e atribuições “femininas” que descrevi anteriormente,* ainda não tem o devido reconhecimento valorativo no mundo patriarcal. E mais, tais valores são muitas vezes, considerados fraquezas e “frescuras de meninas”, ou o moderno “mi mi mi”. Assistimos a explosões de barbárie em numero diretamente proporcional ao grau de dissociação que impera no ser humano e como consequência, na sociedade. Ou seja, sociedades/indivíduos que mais reprimem e negam a energia feminina dentro do homem e a energia masculina dentro de cada mulher, mais bárbaras são. Vide exemplos do que ocorre em países que convivem com disputas internas entre seus governos e facções como ISIS, Boko Haran, Al Qaeda, Al Shabab, etc, que hostilizam, perseguem, violentam, reprimem e desvalorizam a energia do feminino e consequentemente a mulher.
Camille nos sugere que a ideologia da Jihad ocupa o lugar vazio deixado pela evolução do mundo das carreiras profissionais. Sugere que devido ao tédio e aprisionamento do mundo das empresas o homem não tem mais onde vivenciar antigas aventuras longe de casa e com risco de morte. Portanto a oportunidade para vivenciar estas ações físicas seria vivenciada através do alinhamento às guerrilhas e Jihadismo.
Discordo desta hipótese, primeiro porque esse mundo de “empresas e escritórios” nem chegou à realidade de países ou grupos que produzem alguns poucos núcleos fundamentalistas, segundo porque os jovens ocidentais que se alinham a estas guerrilhas, muitas vezes de tão jovens, nem sequer experimentaram o tédio dos escritórios. O que vejo novamente explícito é a predileção e valorização das energias masculinas que preparam o individuo para: – ação, luta, decisão, liberdade, foco, força, disputa de poder – e a repressão das energias femininas que possibilitam o individuo praticar: aceitação de si e do outro, tolerância, cuidado, auto cuidado, criação, gestação, fragilidade, passividade, vinculação, compromisso). Se hoje os homens não tem onde colocar sua força física, como diz a ensaísta, seu desejo de liberdade e aventura (ou seria descompromisso e aversão ao vínculo?) mais necessário e urgente se torna acessarem a energia da criatividade (feminina). Mais necessário se faz que eles próprios livrem-se do circuito condicionante de conquista de poder. Seja nos campos de disputa politica/ideológica, seja no mundo do capitalismo selvagem, predatório e consequentemente anti-ético. Quando um homem alinha-se a uma guerrilha, ou torcida sanguinária, que energia/sentimento ele conecta em si mesmo? Com certeza, o ódio ao inimigo, a raiva, o desejo de matar são os sentimentos que se espera dele naquele momento. A ternura, afeto, respeito a vida, são sentimentos que absolutamente ele deverá abandonar. O único amor que lhe é permitido na luta é o amor e o vínculo pela Pátria/Partido/Religião/Grupo/Ideologia/PODER, ou seja amor por uma Idéia e não pela vida. Quando um homem sucumbe e se entorpece pela busca cega do dinheiro e/ou poder, quais sentimentos ele acessa? A cobiça, a disputa, a destruição do concorrente, a performance agressiva nos negócios que exterminam pequenos e frágeis, e lhe garante o império. Um império, frio, vazio, solitário, anti-ético, inumano, mas o Império.
Penso que o culto que ainda fazemos à guerra, a violência e a disputa serve de instituição reconhecida para a repressão da energia feminina. Como ainda podemos acreditar em resolver conflitos e diferenças, com luta e morte?
A diplomacia, a resolução de conflitos pessoais ou coletivos, a política bem feita, a democracia, a paz, são fruto de conciliação, respeito às diferenças, justiça, ética, negociação e muito trabalho. Para elas precisamos da amorosidade que nos traz a Ocitocina e não da ação pontual (reativa) gerada pela Adrenalina. Precisamos do foco, clareza e racionalidade próprios da energia masculina. Diplomacia e paz são gestadas (energia feminina) e também precisam de limites, contornos e ações focadas (energia masculina).

*Anima e Animus; Homens parecidos com mulheres… – são textos disponíveis no blog.

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